Beit Midrash

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terça-feira, 23 de agosto de 2011

PALESTRA: PAULO E O IMPÉRIO.





Gostaria de agradecer, primeiramente ao Prof. Brian e Edeny por aceitarem ao convite para virem a Manaus, em segundo lugar a parceira Paulus, e terceiro, mas não menos importante, a todos os alunos e pessoas que participaram do evento.

Cláudio e Dina Nogueira.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

PALESTRA: PAULO E O IMPÉRIO.


Tem o objetivo de proporcionar aprofundamento acadêmico na temática que envolve Paulo e o Império Romano. 


      Ministrada pelo Professor Brian Gordon Kibuuka, Membro do Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra.  


Dias 19 e 20 de Agosto (sexta e sábado), das 9 às 12 e das 14 às 17 - carga horária de 16 horas no certificado emitido pela Livraria Paulus. 

INSCRIÇÃO: A compra do livro: Paulo e o Império, R$40,00 na  própria Livraria.

LOCAL: Auditório da Livraria Paulus (Rua Itamaracá 21 - Centro - Próxino a Farmácia Popular).

Conheça e participe do BLOG JOVEM TEÓLOGO 

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Palestra Paulus: Teologia Liberal X Teologia Fundamentalista



TEOLOGIA LIBERAL VERSUS TEOLOGIA FUNDAMENTALISTA

Cláudio Nogueira do Nascimento[1]

1.      INTRODUÇÃO

Em 11 de setembro de 2011 completará dez anos do atentado às torres gêmeas nos EUA, acontecimento que causou comoção mundial. A partir desta tragédia, uma palavra foi largamente utilizada e difundida pela mídia para se referir aos religiosos que haviam praticado o atentado, a palavra: fundamentalista. Mas por que foi usada? Não existiria outra? Relacioná-la aos terroristas talvez não tenha muita importância para os brasileiros, porém faz um enorme sentindo para um americano, pois ela tem um peso ideológico e teológico muito grande para essa sociedade. Isto se deve ao fato de que a Teologia Liberal e Fundamentalista estarem inseridas no macrocosmo americano.
As teologias Liberal e Fundamentalista podem ser enquadradas como produtos intelectuais, da diversidade ideológica, cultural, econômica e social da Europa e EUA nos séculos XIX e XX. Portanto ao tratar deste tema estamos especificamente nos referindo aos conteúdos teológicos produzidos por países de “centro”, contudo nos países “periféricos” há apenas os efeitos tardios desses desenvolvimentos. É mister que para compreendermos o surgimento e o desdobramento dessas duas teologias, precisamos situá-las no tempo e espaço, para isso teremos que entender de forma sucinta o que foi a Reforma, o Pietismo e o Iluminismo. Desta forma, este breve estudo, tem como objetivos desvelar o contexto teológico no qual está inserida a palavra fundamentalista, destacar algumas questões que envolvem os pressupostos teóricos aos quais as teologias Liberal e Fundamentalista estão ligadas, assim como descrever sucintamente acerca do marco teórico e dos principais autores envolvidos com o liberalismo e fundamentalismo teológico.

2.                  BREVE HISTÓRICO ACERCA DOS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS AOS QUAIS A TEOLOGIA LIBERAL E A TEOLOGIA FUNDAMENTALISTA ESTÃO LIGADAS

2.1  A Reforma Protestante    
Esse termo “Reforma” é usado por historiadores e teólogos como referencia a um movimento da Europa Ocidental cujos personagens centrais foram: Martinho Lutero, Ulrico Zuínglio e João Calvino – que tinha como objetivo as reformas moral, teológica e institucional da igreja cristã naquela região. Esse projeto tratava não somente de questões de cunho religioso, como alguns erroneamente pensam, mas também, ou podemos até considerar principalmente, de questões fundamentais de ordem social, política e econômica.
Nesta época buscou-se um novo significado para a religião, movidos pelo espírito da renascença, os reformadores colocaram em xeque questões como: o uso da Vulgata Latina, questionamentos relacionados ao Cânon Bíblico, a Infabilidade Papal etc.
Com o passar dos tempos, os reformadores criaram seus catecismos onde defendiam um retorno exclusivo aos ideais bíblicos, livrando-se da autoridade papal, do escolasticismo e da interpretação baseada na tradição, era o surgimento da “ortodoxia protestante”. O método hermenêutico utilizado visava exclusivamente provar o ensino religioso em questão, desta forma, usava-se de maneira violenta textos de prova arrancados de seu contexto bíblico. Era inevitável o surgimento do que muitos estudiosos denominam “escolasticismo protestante”, como resultado houve um estancamento teológico, especialmente nos campos da exegese e história bíblica.

2.2  O Pietismo
A crescente busca pela “ortodoxia” dominou o protestantismo fazendo aparecer seus aspectos positivos e negativos:
a) aspectos positivos: a “ortodoxia” se voltava à defesa racional de verdades cristãs e a uma ardente preocupação com a correção doutrinária;
b) aspectos negativos: formou-se uma preocupação acadêmica com o preciosismo lógico, em vez de se constituir em preocupação relacionar a teologia aos temas cotidianos, enfatizou-se o academicismo.
O movimento pietista, possivelmente, teve seu inicio com a publicação, em 1675, da obra de Felipe Jakob Spener, Pia Desideria (Anseios Piedosos). A principal proposta era estabelecer uma ênfase ao aspecto de estudo bíblico individual, pois havia uma crescente intolerância com a esterilidade da “ortodoxia” face às terríveis condições sociais enfrentadas após a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648). Assim de acordo com o pietismo, uma reforma doutrinaria deveria sempre vir acompanhada de uma mudança de vida.
Para os pietistas, o ser humano não é apenas justificado pela fé, mas, a partir daí, começa a viver em Cristo uma nova vida. Essa nova vida implica um constante progresso espiritual, chamado perfeição cristã, o que necessariamente provocará isolamento do mundo.

2.3  O Iluminismo (aufklärung) - “Período das Luzes”
Iluminismo é um termo amplo, abrangendo um conjunto de ideias e atitudes características do período de 1720-1780, como o uso livre e construtivo da razão, em uma tentativa de destruir os velhos mitos que, na ótica iluminista, mantinham os indivíduos e sociedades presos à opressão do passado (devemos entender esta expressão relacionada a Idade Média com seus pressupostos religiosos). Dentre as principais ideias do Iluminismo destaca-se o Racionalismo.

2.3.1 Racionalismo: com a proliferação do Protestantismo havia a necessidade da formação de seus pastores, então durante esse período foram criadas varias Universidades. As alemãs se transformaram em centros de revolta contra o Antigo Regime (Absolutismo Monárquico). Os estudantes universitários protestantes da área da teologia tendiam a se alinhar com o Iluminismo, ao passo, que a liderança eclesial mais conservadora tendia a apoiar o Antigo Regime. Apesar de aparentemente ter sido incapaz de produzir mudanças sociais, políticas ou eclesial que fosse significativa, o radicalismo conseguiu organizar uma significativa oposição às ideias que sustentavam as Igrejas.
  As principais características do Racionalismo são: a) a mente e suas ideias são a realidade primaria; b) a autoridade final não é a revelação e a fé, mas sim a razão.

2.3.2 Teologia Racionalista: alegou-se que a razão era extremamente qualificada para avaliar as crenças e práticas cristãs, nessa perspectiva se eliminava quaisquer elementos que fossem irracionais ou supersticiosos. Desta forma, muitas posições do cristianismo foram colocadas ao escrutínio da razão, a saber:
a) A possibilidade de milagres: a nova ênfase científica, as ordens mecânicas do universo, talvez o legado mais importante de Isaac Newton, levanta duvidas com relação aos relatos de milagres encontrados no Novo Testamento. A obra de David Hume (Ensaios sobre milagres, 1748) era realmente considerada como demonstração da evidencia da impossibilidade de milagres.
Com a impossibilidade de existir milagres: a crença na ressurreição de Cristo deveria ser revista o primeiro a propor isso foi Herman Samuel Reimarus:
       
Para se verem livres da dificuldade da morte de Jesus, os discípulos deram-lhe a importância de uma redenção espiritual. Mas esta interpretação espiritual de sua morte não os teria ajudado se eles não tivessem inventado, também, a ressurreição (SCHWEITZER, 2003, p.30).

Para David Friedrich Strauss, excluindo a hipótese da ressurreição como a “ocorrência objetiva de um milagre”, a crença na ressurreição deveria ser situada em uma esfera puramente subjetiva. Os evangelistas deveriam ser encarados como pessoas que compartilhavam uma visão mítica que dominava o contexto cultural em que estavam inseridos.
Com essa posição Strauss afastava-se da visão de Reimarus, a saber, de que os evangelistas haviam distorcido os relatos acerca de Jesus de forma consciente ou deliberada. Podemos com certeza afirmar, que os racionalistas não perderam a chance de reduzir o número de milagres, onde podiam explicar o episodio por causas naturais, eles não hesitavam por um momento em fazê-lo.
b) Doutrina do pecado original: essa ideia, que se inicia com Adão, de que a natureza humana é imperfeita, corrompida, sofria forte oposição do movimento iluminista. Voltaire e Rousseau criticaram essa doutrina, alegando que sua noção encorajava o pessimismo em relação à capacidade humana, impedindo assim o seu desenvolvimento social e política.
Para os iluministas, o conceito de pecado original era em si mesmo opressor e, na verdade, a humanidade precisava se libertar desse conceito. Essa libertação se daria pela critica iluminista.
c) A Questão da Inspiração da Bíblia: a Escritura era considerada como um livro divino, o que a diferenciava dos outros livros. O Iluminismo alemão criou a tese de que a Bíblia era uma obra de muitas mãos, que às vezes demonstrava certa contradição interna e estava aberta, como qualquer outro livro, aos métodos de análise e interpretação. O efeito causado por este questionamento foi o enfraquecimento do conceito de “revelação sobrenatural”
d) A Busca Pelo Jesus Histórico: como o Iluminismo fez um relevante questionamento em face da “ortodoxia cristã” referente à pessoa de Jesus de Nazaré surgiram dois importantes desdobramentos: as origens da “Busca Pelo Jesus Histórico”; e o surgimento da “Teoria moral da expiação”.            

3.      TEOLOGIA LIBERAL E A TEOLOGIA FUNDAMENTALISTA

3.1              Teologia Liberal
O Protestantismo Liberal é um dos movimentos mais importantes que surgiram dentro do pensamento cristão moderno, mas definir suas origens é um trabalho complexo. O termo Liberal expressa ênfase no direito do individuo de definir os termos de sua fé sem ser constrangido por nenhuma autoridade externa (emancipação). O objetivo dessa nova teologia não era negar certas crenças, mas transformar o pensamento cristão à luz da filosofia, da ciência e da erudição bíblicas modernas.
O Protestantismo Liberal clássico surgiu na metade do século XIX, na Alemanha, em meio à crescente percepção de que a fé e a teologia cristã necessitavam serem revistas à luz do conhecimento moderno. Desde o inicio a proposta era lançar pontes para suprir a lacuna que havia entre a fé cristã e o conhecimento moderno. Era necessário apresentar um programa significativo de flexibilidade em relação à teologia tradicional. O liberalismo propunha, então, uma reinterpretação doutrinária.
O Liberalismo abandonaria completamente a ênfase teocêntrica, o principal papel da religião seria a educação moral dos seres humanos. Isto pode ser visto nas obras de Immanuel Kant, onde a religiosidade autêntica era vista de acordo com os deveres que podiam ser discernidos racionalmente.
Já o considerado pai de teologia liberal, Friedrich Daniel Schleiermacher (1768-1834) insistia que a essência da religião não está em argumentos racionais, dogmas revelados, rituais eclesiásticos ou mesmo moralidade, mas num sentimento profundo de total dependência de uma realidade infinita. Assim, falar em Deus é sempre falar da experiência humana de Deus.
Enquanto isso, Albert Ritschl (1822-1889) rejeitava as especulações metafísicas de Hegel e Schleimacher e apelando ao pensamento de Kant, limitou a religião e a teologia à esfera dos valores. A essência do cristianismo está no ideal de Jesus quanto ao “Reino de Deus”. Esse Reino está dominado por valores éticos, que sustentará o desenvolvimento da sociedade alemã.
       Com este resumo dos principais teólogos liberais, podemos destacar três temas principais da Teologia Liberal:
                   I.            Imanência divina, ou seja, a continuidade entre Deus e a natureza humana seria uma espécie de panteísmo (mutualidade entre Deus e o mundo).
                II.            Moralização do dogma: tendência de reinterpretar todas as doutrinas cristãs em termos éticos e morais.
             III.            Crença na Salvação Universal; com isso houve a tendência de se identificar a cultura alemã com o cristianismo.

3.2              Teses sobre o Liberalismo na Visão dos Fundamentalistas.
Para os teólogos fundamentalistas o Liberalismo teológico se distinguiu pela aceitação:
a)                      Das teorias das ciências da natureza a respeito da idade e forma de surgimento do universo e da vida (evolucionismo). Assim as historias narradas em Gênesis sobre a criação foram interpretadas como “mito”.
b)                       Pela adoção da Teoria das Fontes, pois essa teoria rejeitava a autoria mosaica do Pentateuco e explicava a formação dos livros da Lei, através da compilação de diversas fontes: J (Javista), E (Eloísta), D (Deuteronômica) e P (Sacerdotal).
c)                      A história das Religiões Comparadas que propunha a influencia determinante das religiões dos povos vizinhos de Israel na formação das tradições do Judaísmo Primitivo.
d)                     O Liberalismo aceitou do naturalismo a explicação filosófica do mundo, pois para os naturalistas, a natureza é uniforme e as leis que as governam são universais. Desta forma, a possibilidade de milagres foi rejeitada.
e)                      O Liberalismo Teológico aceitou o emprego de métodos e técnicas originárias das ciências históricas e naturais no estudo da Bíblia e de seus manuscritos, com ampla e conhecida repercussão na reflexão teológica.  


3.3              Teologia Fundamentalista
O Fundamentalismo é, em primeiro lugar, uma oposição contra a transformação da religião determinadas pela modernidade. Sendo assim, os fundamentalistas querem defender a sua verdade religiosa, pois para estes o modernismo teológico representa uma ameaça aos fundamentos da civilização cristã, ou seja, os fundamentalistas sentem-se ameaçados pelos poderes da modernidade: pluralismo, relativismo e destruição das autoridades. Assim o fundamentalista não pretende a modernização da religião, mas a fundamentação religiosa explícita da modernidade.
É um movimento de reação contra as chamadas correntes intelectuais, suas críticas giram em torno de questões como: a evolução (darwinismo), a inerrância da Bíblia (criticismo bíblico), a questão entre pré e pós-milenismo e o compromisso social como parte da missão (Evangelho Social). Com o decorrer do tempo a oposição a estes movimentos ganhou um caráter militante, de combate a heresias e de preservação da verdadeira e sã doutrina. Neste momento, o Fundamentalismo ultrapassa a esfera teológica indo para a esfera social, buscando inibir qualquer tipo de pensamento que colocasse em perigo as doutrinas bíblicas como interpretadas pelos fundamentalistas.  
Uma das características dos fundamentalistas é que o mundo ocidental precisa voltar a ser cristão. Em consequência, exigem que o Estado defenda, nas escolas públicas suas concepções bíblico-fundamentalista do ser humano. O maior exemplo deste episodio ocorreu no Estado Americano do Tennessee, onde um professor de Biologia foi condenado por ensinar a teoria da Evolução das espécies de Charles Darwin. Esse caso ficou conhecido como “Scopes”. O alvo dos fundamentalistas é estabelecer uma sociedade perfeita, que somente será estabelecida quando todos se submeterem à verdade religiosa.           
Outro bom exemplo de fundamentalismo pode ser visto no Concílio Vaticano I (1869-1870) onde o papa Pio IX publicou um Syllabus de erros, entre os quais nomeou: o racionalismo, indiferentismo, socialismo, comunismo, sociedades bíblicas, independência do Estado em questões culturais e educacionais. Rejeitado estava o mundo e a separação entre Igreja e Estado. Os sacerdotes foram obrigados a prestar juramento anti-modernista, em 1910, no pontificado Pio X. 
Como a ideologia liberal se espalhou e dominou vários seminários, faculdades e igrejas nos Estados Unidos, os fundamentalistas (evangelicais) se retiraram voluntariamente ou eram forçados a sair por meio de julgamentos eclesiásticos. Assim, novas denominações, escolas, seminários e faculdades forma criadas com o intuito de se oporem ao liberalismo. Os professores conservadores do Seminário de Princeton uniram forças e publicaram um artigo defendendo a inspiração da Bíblia plena e verbal, afirmando que as Escrituras são a única regra de fé e prática. Nestes seminários foram elaborados estudos que defendiam as ideias pré-milenistas da vinda de Cristo, baseados nos aspectos dispensacionalistas elaborados por John Nelson Darby (1800-1882). Cyrus I. Scolfield (1843-1921) fundou a Missão Central Americana em 1890, e popularizou o dispensacionalismo nas notas de rodapé da Bíblia Scolfield.
Com as publicações dos folhetos os “Fundamentos”, as principais ideias defendidas pelos fundamentalistas foram largamente espalhadas para outros países, essas ideias são:
                                 I.            Em relação à Bíblia: inerrância absoluta quanto aos manuscritos originais, infabilidade nos limites da exegese, naturalmente está fora de cogitação qualquer forma de contextualização da Bíblia. Isso resulta em forte hostilidade à moderna teologia e seus métodos;
                              II.            A cristologia fundamentalista reage fortemente ao unitarismo e ao movimento do Jesus Histórico, para alguns estudiosos, essa exacerbação Cristológica é comparada a visão docetista;
                           III.            Enquanto a Teologia Liberal não dá ênfase a escatologia, esta é a mais importante área de preocupação do fundamentalismo; uma das paixões é a esquematização da Bíblia em períodos chamados dispensações. O dispensacionalismo é um esquema pré-milenista, ou seja, para este grupo há sete dispensações: a) Inocência; b) Consciência; c) Governo Humano; d) Promessa; e) Lei; f) Graça e g) Governo Humano.

Para Antonio Gouvêia Mendonça, os resultados do Fundamentalismo no Brasil podem ser verificados a saber: 1) uma fé cristã inteiramente voltada para o sobrenatural e para o não histórico; 2) não há nenhuma abertura para o social, para igreja no mundo; 3) uma fé passiva em busca de sinais, não favorecendo nenhum tipo de reflexão teológica; 4) fé cristalizada nas doutrinas (dogmatismo escolástico), 5) autoritarismo e ultra-conservadorismo. Com essa postura, afirma Mendonça, os fundamentalistas estão transformando em tragédia a formação do ministério teológico brasileiro, com seus institutos cujo objetivo é oferecer uma leitura direcionada da Bíblia e eliminar qualquer forma de reflexão e crítica literária.  

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir desta breve contextualização histórica foi possível delinear os campos de ação onde se desenvolvem as Teologias Liberal e Fundamentalista e apreender o contexto onde se aplica a palavra fundamentalista, utilizada e difundida pela mídia para se referir aos religiosos que haviam praticado o atentado de 11 de setembro nos EUA.
Compreendemos o porquê desta palavra, e não outra ter sido utilizada definindo-a a partir do peso ideológico e teológico dentro do contexto do qual faz parte.
McGrath (2005) sugere que o Liberalismo estava pronto a sacrificar as doutrinas cristãs, na tentativa de tornar o cristianismo aceitável aos olhos da cultura contemporânea. A teologia Liberal teve seu auge no inicio do século XX, mas no final da década de 1970 e início de 1980, embora continuasse uma nítida presença nas faculdades de teologia, começou a sua derrocada, nos dias atuais é normalmente considerada em declínio, tanto em relação à teologia moderna, quanto à vida da igreja em geral.
Para Prócoro Veslasques Filho (2002) a Teologia Fundamentalista é marcadamente ideológica. Não se trata de metodologia nem de hermenêutica, mas de uma mentalidade, isto é, uma ideologia. Isso a torna doutrinariamente rígida e, por isso intolerante, fechada, pois para esses teólogos tudo está decidido. Como resultado desencadeia-se uma estagnação intelectual.
Com o reconhecimento dos cursos de Teologia pelo MEC no Brasil, a partir de 1999, e a promulgação de diversas diretrizes curriculares, alguns teólogos conservadores, temem que a Teologia Liberal volte a crescer em nosso país. Com isso possivelmente veremos um estreitamento de posições, ou seja, alguns terão a tendência de se polarizarem como teólogos liberais e outros como fundamentalistas, algo semelhante ao acontecido nos Estados Unidos. Infelizmente, isso já é uma realidade no Brasil, pois inúmeros artigos descrevem o crescimento desta intolerância em alguns ramos do protestantismo brasileiro, mais especificamente nas regiões sudeste e sul do país.
Caso essa tendência se afirme, a Teologia que começou a dar seus primeiros passos rumo a uma independência em relação às teologias de centro (Europa e E.U.A), pode naufragar antes de mesmo de se lançar ao mar do conhecimento. Ou pior, se transformará em mero produto de comercialização de ensino, incapaz de gerar uma mudança significativa no campo religioso brasileiro.                      

REFERÊNCIAS
McGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e filosófica: uma introdução à teologia cristã. São Paulo: Shedd Publicações, 2005.   
MENDONÇA, Antonio Gouvêia; FILHO, Prócoro Veslaques. Introduçao ao Protestantismo no Brasil. 2ª Ed. São Paulo: Loyola, 2002.
MATOS, Alderi Souza de. Fundamentos da Teologia Histórica. São Paulo: Mundo Cristão, 2008.
MACKINTOSH, Hugh R. Teologia Moderna: de Schleiermacher a Bultmann. São Paulo: Nova Século, 2004.
CAIRNS, Earl Edwin. O Cristianismo através dos séculos: uma história da igreja cristã. 2ª Ed. São Paulo: Vida Nova, 2008.
SCHWEITZER, Albert. A Busca do Jesus Histórico: um estudo crítico de seu progresso de Reimarus a Wrede. São Paulo: Novo Século, 2003.  


[1] Farmacêutico e Bioquímico, Teólogo com especialização em Judaísmo, professor das disciplinas: História do Judaísmo, História do Cristianismo e Exegese do Antigo Testamento; claugov@yahoo.com.br  

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Jesus, o Império e o Judaísmo - Parte III

III – A realidade do judaísmo num mundo romanizado.

            A definição de um judaísmo estreitamente monolítico enfrenta sérias contestações no mundo acadêmico atual. E não são poucas as dificuldades em aceitar a velha e tradicional fórmula usada pelos teólogos do NT, tanto católicos quanto protestantes, para convencer o mundo cristão de que Jesus se opunha ao judaísmo do mesmo modo como a Lei se opunha ao mandamento do Amor radicalizado nas pregações de Jesus. Essa proposta, que até pouco tempo atrás catalisava outras premissas que davam sustentação à fé cristã. Elas se encontravam em manuais de teologia. Esse universo retratado do Jesus X Judaísmo já não funciona mais, visto ser uma imagem construída sobre a auto-afirmação da Igreja sobre o judaísmo.
            A definição do judaísmo, tomado apenas como uma religião do mundo antigo, levanta sérios problemas. É tendência comum os intérpretes modernos assumirem por “judeu” a identidade dos personagens do NT, tais como Herodes o Grande, Arquelau, os Sumos-Sacerdotes Anás e Caifás, o fariseu Gamaliéu e o próprio Jesus. Ao fazer tais generalizações, todas as “diferenças e interesses políticos desaparecem” (p.15). Esse enfoque de um judaísmo padrão serve mais para reforçar a oposição de Jesus ao judaísmo como um todo.        
O problema em definir judaísmo para Grabrielle BOCCACCINI:
“Os séculos da revolta macabaica [168 aC] à guerra judaica [66-74 dC] não foram nem o ponto conclusivo de um judaísmo monolítico já plenamente estabelecido, antes de Jesus, nem o ponto inicial de um processo de evolução linear que naturalmente tenha desaguado no estágio rabínico. Esses séculos foram uma era de diversidade e transição (“judaísmo médio”) de muitas correntes judaicas em competição, na qual tanto o Cristianismo quando o Judaísmo Rabínico tiveram, digamos, suas origens em raízes comuns orientadas pelo pensamento judaico durante o período pós-exílico” (Roots of Rabbinic Judaism, p. XIV).      
            Um dos problemas para definir Judaísmo é porque se deve levar em conta não apenas sua realidade religiosa fragmentada, alienada da situação histórica do longo e complexo período de transformações porque passava toda a costa Mediterrânea por mais de seis séculos antes de Jesus. Portanto, Judaísmo não é um elemento isolado ou fora de um conjunto de fatores políticos e sociais que também estavam em processo de transformação. Trata-se de um grave equívoco tentar entender o judaísmo sem relacioná-lo às condições que ajudaram a forjar as variantes de “judaísmos” que nasceram desse cenário.   
Roma ofereceu ao Ocidente seu “Salvador” do mundo. Caiu Júlio César Otaviano (também conhecido como Cesar Augusto ou Otávio Augusto - 27 aC – 14 dC), filho adotivo de Julio Cesar, foi o primeiro imperador romano. Com a idealização da Pax Romana, promoveu um processo de “pacificação” universal que serviu para alicerçar e garantiu o poder imperial baseado na imposição da paz a qualquer custo. A nova ordem se impunha por todo Mediterrâneo, promovida pela política de submissão dos povos bárbaros e na morte aos rebeldes e opositores. A prosperidade de Augusto era simbolizada pela submissão em troca da proteção do estado. A manutenção da ordem era retratada com grandes eventos públicos nos festivais em praça de centros urbanos. Logo ficara evidente o poder manipulador do Império em demonstrações e eventos populares, conhecidos como “pão e circo” para controlar povos subjugados e impedir a “desordem” social. O culto pessoal ao imperador tinha motivação religiosa e também contribuía para domesticar as orlas bárbaras.
            Nada mais anacrônico do que a civilização da Pax romana governada pelo espírito de violência legalizada sob a bandeira do exército romano. A paz era controlada pela violência e o derramamento de sangue dos povos que recusavam lealdade à dominação. A brutalidade, o terrorismo e a repressão foram recursos sistematicamente empregados para combater rebeldes e bandidos de toda espécie. A força bruta e a violência tinham a legitimidade do estado, sendo usado de modo sistemático nas províncias romanas, especialmente depois da conquista da Judéia por Pompeu, em 63 aC. Além desse toque politizador da Terra de Israel ocupada militarmente por Roma, a história do próprio Jesus encontra-se inserida na pátria judaica romanizada.
       

domingo, 5 de junho de 2011

Jesus, o Império e o Judaísmo - Parte II

 A Proposta de Richard HORSLEY no seu Jesus e o Império.

A idéia central da obra de Richard HORSLEY é mostrar Jesus como um profeta que dedicou sua vida a pregar uma revolução social na Palestina, assumindo características que o fizeram se aproximar das tradições proféticas de Moisés e Elias.
A tese principal defendida por HORSLEY, partindo do estudo do evangelho de Marcos e da Fonte Q, está em que Jesus promoveu uma revolução social na pátria judaica. Ele “liderou um programa de renovação do povo, e também pronunciou a sentença de Deus sobre os governantes da nação, sobre os romanos e sobre os seus representantes em Jerusalém, a face que a ordem imperial romana apresentava à população da Palestina” (p.85).
Assumindo a condição de Profeta, e tendo se dirigido aos camponeses no entorno do Lago da Galiléia, Jesus dedicou sua vida à causa de uma grande transformação capaz de levar o povo camponês da Galiléia a uma “renovação pessoal e comunitária” (p.85). Estava convicto de que sua missão teria efeitos decisivos a ponto de reverter a situação de opressão a que essa gente estava submetida. Por isso, “Jesus se dirigiu aos pobres camponeses de seu tempo, subjugados pelo cruel domínio do Império Romano e de seus associados locais da elite herodiana e judaica, conclamando-os para uma revolução que só teria sucesso se partisse da conscientização da situação de opressão em que viviam” (Airtonjo).
“Segundo Horsley, Jesus só pode ser compreendido dentro do contexto do imperialismo romano de sua época, e a sua pregação da chegada do "reino de Deus" significa a expectativa da libertação política e social aqui e agora, que na tradição camponesa, Deus providenciaria para aqueles que eram fiéis à aliança” (ver www.airtonjo.com). Até recentemente os manuais de teologia justificavam a originalidade do programa de Jesus enfatizando seu ministério público em contraste com as matrizes religiosas de suposto “judaísmo legalista” sob o patrocínio do farisaísmo. Visto sob o prisma da oposição radical à Lei/Tora, o fenômeno Jesus passou a ser lido como reformador da estrutura religiosa de um judaísmo decadente, legalista e vazio para a edificação da nova Religião do Amor. Desta premissa evoluíram construções teológicas distorcidas sobre um Jesus hostil à matriz judaica na qual viveu a toda sua vida.
Ao superestimar a excentricidade exclusivista do comportamento religioso-espiritual de Jesus, e a negativa da sua atuação política na sociedade, abriu-se caminho para um amplo desenraizamento da ação política no ministério público. Durante muito tempo, esse tipo de leitura despolitizadora desferiu sérios golpes sobre o Jesus histórico. Seu ministério era transportado para uma divisão entre dois mundos antagônicos: o judaísmo o cristianismo helenista.
            Ao oferecer pistas para a recuperação do Jesus histórico, HORSLEY encontra nos textos do Evangelho de Marcos e nos ditos da Fonte Q, elementos da dinâmica participativa de Jesus no amplo contexto social judaico: religião, política e economia. Tal inserção nos obriga a dar a devida atenção à força política de sua mensagem. O Jesus despolitizado tornou-se em nossos dias uma tendência ideológica poderosíssima que, infelizmente, predispõe o leitor a separar Religião da Política e da economia facilitando, assim, “reduzi-lo a uma mera figura religiosa” (p.12). Esse esforço de proteger Jesus contra a contaminação dos elementos “profanos”, desassociando-o da política e da economia, é uma tendência do “individualismo ocidental” visando facilitar sua apropriação.    
O passo seguinte á despolitização do ministério público de Jesus consiste na “domesticação” que insiste na livre apropriação de atitudes que refletem a imagem dócil de um pacifista. Ao lançar mão da apologia para reforçar um messias preocupado com o mundo espiritual, toda a agenda política fica claramente comprometida na sua mensagem. Particularmente notáveis a esse respeito são as declarações de Jesus: Dai a Cesar o que é de Cesar e a Deus o que é de Deus e amai os vossos inimigos. Tais declarações poderiam sinalizar para um Jesus nada comprometido com a situação política da Judéia romana. O posicionamento frente aos tributos a Roma passava também o modo de se posicionar diante da Religião, já que a manifestação do domínio imperial romano através da cobrança de impostos servia de recado à população sobre quem era o dono da terra. Então, parece incabível aceitar que Jesus, assim como a maioria de seu povo, não estivesse rejeitando o Império tendo Deus como único Senhor!
Na luta pela renovação da aliança com Deus, Jesus se posicionou contra os dirigentes que governavam a Galiléia-Judéia, dirigindo, sobretudo, aos pobres camponeses de seu tempo que sofriam o jugo da dominação imperial romana. Como profeta de seu tempo, Jesus convocou esse povo para uma revolução social para a superação da opressão romana. Na mensagem captada nos discursos da Fonte Q, Jesus mostra um “Reino de Deus” presente entre os pobres. É para estes que o Reino é oferecido em forma de multiplicação de alimentos, remissão das dívidas, cooperação mútua, curas e milagres (Q 6,20-49). Ao propor a renovação para estes pobres, o Reino também mostra que os dirigentes e os poderes locais serão todos julgados e condenados por Deus (p. 85).  
A exemplo da Fonte Q, o programa de Jesus, no Evangelho de Marcos, expõe o movimento de seus primeiros seguidores em oposição ao Império, bem como ao regime de clientelismo exercido pelos governantes locais.
A principal alternativa no programa de Jesus baseia-se na pregação de uma renovação comunitária da família e clãs tradicionais inspirados nos moldes da antiga aliança de Israel com Iahweh. Ao se dirigir aos camponeses e às aldeias no entorno do lago da Galiléia, Jesus estava convencido da eficácia de um movimento de resistência e protesto tal como as tradições populares dos profetas bíblicos fizeram. Numa terra romanizada, socialmente assolada pelo desmantelamento das instituições, a alternativa era revigorar os antigos modelos de integração comunitária. Nas aldeias agrárias da Galiléia, a FAMÍLIA fornecia, pois, um ambiente singular usado para reeducar a consciência coletiva. É bem possível que nesse contexto é que emergem as “comunidades semi-autônomas cuja forma político-religiosa de administração era a assembléia da aldeia, Kenesset, dirigida por anciãos locais” (p.66). De um lado, os governantes mergulhados num mar de corrupção e privilégios, de outro, a imensa maioria da população, refém das altas taxas de impostos e tendo que produzir para sustentar as classes dirigentes. Eles estavam divididos por um enorme abismo social.      
A articulação entre as duas realidades, Roma e Estados Unidos, é apresentada na primeira parte do livro como uma crítica aos efeitos da distorção da despolitização de Jesus pela sociedade norte-americana. Ao falar da “NOVA DESORDEM MUNDIAL”, nas primeiras páginas (pp.7-20), HORSLEY se refere ao atual “Império Norte-Americano”. Ele arrisca traçar um paralelo entre o antigo Império Romano, em seu ápice, e o Império Americano de hoje. E conclui que ambos se tornaram opressores de povos subjugados, e em tom profético, ousa dizer que assim como a Antiga Roma, também a América cairá em desgraça.
 Sem constrangimento, HORSLEY aponta as contradições presentes na sociedade americana. Nas origens da colonização, os colonos americanos se orgulhavam de se inspirarem nas histórias da Bíblia para lançarem seus ideais de “Povo Eleito”, fugindo da opressão do novo Faraó, Jorge III, para buscar a liberdade na nova Terra Prometida da América. A figura de Jesus parecia inspirar novos movimentos de libertação e criar uma sociedade mais justa e livre dos opressores externos.
Trata-se, pois, de uma frustrada tentativa de se apropriar indevidamente de tradições do povo bíblico com intuito de legitimar a dominação atual. É, no mínimo, irônico que os fundamentos religiosos do capitalismo norte-americano, estampados nas cédulas do dólar, revelam o esforço para promover a relação entre Deus e o mercado: “In God we trust” (Em Deus nós confiamos). Esse mesmo sentimento religioso puritano está presente no hino nacional: God Bless America. Difícil mesmo é perceber qual é o grau de comprometimento dos ideais norte-americanos de liberdade com a proposta do Reino de Deus proclamado por Jesus nos evangelhos. Ora, “os americanos passaram a ver-se como a nova Roma” e “os pais fundadores consideravam-se instituidores de uma República à imitação da antiga Roma” (p.9). Não consigo ver na proposta de se inspirar na herança bíblica do Êxodo para criar um ideal de democracia e liberdade outra coisa senão a distorção dos propósitos do Reino de Deus para fins de legitimar uma nova ideologia de imperialismo, disfarçada sob leitura despolitizadora de um Jesus “domesticado”.   
Em sua identidade, “os americanos passaram a ver-se como a nova Roma”. E "ao cultivar a 'virtude republicana', a busca do bem da sociedade como um todo, os líderes políticos da nova nação pretendiam ansiosamente evitar os erros dos antigos romanos". Contudo, "parece algo totalmente diferente da identidade originária dos americanos - um povo bíblico praticando a virtude republicana romana - o fato de os Estados Unidos terem se tornado recentemente a única superpotência remanescente" (p. 9).
As coisas ficaram mais complicadas depois dos acontecimentos de 11 de Setembro de 2001, quando os americanos foram obrigados a se questionar porque os outros povos os odeiam tanto, sendo que essa mesma pergunta já era feita pelos povos sobre os americanos: “porque os americanos nos odeiam”?
Horsley lança, pois, a provocação àqueles que fizeram de Jesus uma mera figura religiosa, despolitizado em sua ação, reduzido a um sujeito sem significado político, alguém incapaz de causar qualquer ameaça às instituições de seu tempo. Só não conseguem explicar a embaraçosa situação causadora da morte de Jesus. Porque um sujeito tão inofensivo deveria ser morto na cruz romana? Para evitar tocar esse problema, Jesus sofreu um processo de domesticação política, tornando-se alienado dos problemas que tanto infligiam seu povo oprimido pela mesma Roma que o executou.
Olhando de cima da pirâmide social, Jesus é "uma figura que está na origem de uma religião a partir de outra, o surgimento do cristianismo a partir do judaísmo" (p. 12). Ou pior que isso, um homem de índole religioso que odiava se envolver em política. Nada mais cômodo para quem vê essa realidade sob a ótica do opressor, da vitória do cristianismo sobre o judaísmo depois de Constantino! Esse construto teológico, baseado na superioridade, porém, contradiz as formas improvisadas de movimentos de Jesus sugeridos nos evangelhos. Os seguidores desse movimento sofreram perseguições por conta do ideal de Reino de Deus que era defendido, como a prática da justiça, o perdão e a destruição dos poderes diabólicos que se manifestavam na opressão dos governantes. Se, no século I, idéias como essas incomodaram as autoridades levando-as a eliminarem pessoas como Jesus, então “não temos mais condições de ficar sossegados com essas representações domesticadas de Jesus. Não podemos mais ignorar o impacto do imperialismo ocidental sobre povos subordinados e sobre as formas de reação de povos que sentem suas vidas invadidas. A analogia histórica 'coincidente' é muito inquietante..." (p. 12).
A abordagem contextual política de Horsley sobre Jesus, aliás, do ponto de vista do contexto da opressão romana, não pode subestimar o complexo universo ambiente cultural-religioso judaico da Terra de Israel. Afinal, foi nesse universo doméstico judaico do século I que Jesus exerceu o ministério e morreu crucificado. Portanto, se existe uma força inspiradora germinal no movimento criado por Jesus, este deve ser compreendido como uma característica de outros movimentos de seu tempo. A proposta abarca, nesse caso, o ideal da tradição popular do profetismo bíblico israelita, força arrebatadora que modelou a tom profético de seus protestos.
Conclui-se daqui, que o tom político na mensagem de Jesus não pode ser esvaziado de conceitos religiosos essenciais, como Reino de Deus, da mesma maneira que este conceito não está alienado de valores políticos.